Análise à informação vinculativa da Autoridade Tributária de 03-05-2019 – transformação de uma sociedade por quotas numa sociedade de investimento imobiliário – SIIMO; caducidade da isenção de prédios para revenda
Por Cláudia Rocha – Advogada
O caso concreto submetido a apreciação da AT relaciona-se com uma sociedade por quotas que se dedica à compra e venda de imóveis, compra para revenda de imóveis e, ainda, gestão de património imobiliário, que pretende transformar-se num Organismo de Investimento Coletivo (OIC), sob a forma societária, mais concretamente, numa Sociedade de Investimento Imobiliário (SIIMO).
A sociedade por quotas, não obstante a transformação, pretende manter o mesmo objeto social.
De acordo com o requerente do pedido de informação vinculativa, estar-se-ia perante uma mera alteração da natureza jurídica, sendo que a sociedade inicial não seria dissolvida.
No âmbito da sua atividade, essa sociedade adquiriu, em território nacional, vários imóveis, com o objetivo de revender os mesmos, pelo que a sua aquisição beneficiou da isenção de IMT (Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis).
Com efeito, encontrava-se ainda a decorrer o prazo de caducidade dessa isenção, previsto no n.º 5 do art. 11.º do CIMT, segundo o qual a aquisição deixa de beneficiar de isenção logo que se verifique aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de 3 anos ou o foram novamente para revenda.
Neste contexto, pretendia-se esclarecer duas questões:
1) Se a transformação da natureza judicia da sociedade consubstanciava uma transmissão onerosa do direito de propriedade sobe os imóveis por si detidos e, por conseguinte, se constituiria um facto tributável para efeitos de tributação em IMT;
2) Se o prazo de 3 anos para a revenda dos imóveis detidos pela sociedade continuaria a decorrer na esfera da nova estrutura societária (SIIMO).
Procurando responder à primeira questão, a AT começou por analisar a aplicabilidade, ou não, do Código das Sociedades Comerciais (CSC) à transformação da sociedade ou, pelo contrário, se seria de aplicar o Regime Geral dos Organismos de Investimento Coletivo (RGOIC), aprovado pela Lei n.º 16/2015, de 24 de janeiro.
O n.º 1 do art. 11.º do RGOIC estabelece que «os organismos de investimento coletivo sob a forma societária regem-se pelo presente Regime Geral e ainda pelo disposto no Código das Sociedades Comerciais, salvo quando as normas deste se mostrem incompatíveis com a natureza e objeto específicos destes organismos ou com o disposto no presente Regime Geral».
Por sua vez, a al. e) do n.º 2 do art. 11.º do RGOIC dispõe que são incompatíveis com o CSC, entre outras, as normas respeitantes ao regime de fusão, cisão e transformação de sociedades.
Terá sido intenção do legislador referir-se à transformação de qualquer sociedade comercial num OIC ou apenas a transformações operadas entre diferentes tipos de OIC’s?
A AT entendeu (e bem, a nosso ver) que o CSC só não se aplicará quando estejamos perante transformações de organismos de investimento coletivo, como por exemplo, a transformação de um organismo de investimento coletivo aberto em fechado e vice-versa.
Assim, na situação concreta, uma vez que se trata da transformação de uma sociedade por quotas num OIC, serão de aplicar as regras do CSC, salvo se estas normas se mostrarem incompatíveis com a natureza e objeto específicos destes organismos (o que, de todo o modo, sempre será aferido pela CMVM aquando da sua constituição)
Ora, nos termos do n.º 3 do art. 130.º do CSC, a transformação de uma sociedade não importa a dissolução dela, salvo se assim for deliberado pelos sócios (no caso em apreço, não existia qualquer referência a uma deliberação dos sócios nesse sentido, pelo que se partiu desse pressuposto).
Isto significa que a transformação de uma sociedade por quotas numa SIIMO não importa a sua dissolução, havendo outra sociedade.
No fundo, existe apenas uma alteração na sua natureza jurídica.
Após esta análise, restava apenas aferir se esta situação se enquadrava, ou não, na incidência objetiva do IMT.
O n.º 1 do art. 1.º do CIMT, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, dispõe que este imposto incide sobre as transmissões previstas neste código, nomeadamente, no art. 2.º.
Analisando o referido art. 2.º, conclui-se que a transformação de uma sociedade por quotas em SIIMO não se subsume nas situações aí previstas.
Além do mais, a transformação desta sociedade não pressupõe qualquer transmissão com carácter de onerosidade, que é dos pressupostos de tributação em sede de IMT.
A AT conclui, assim, que a transformação de uma sociedade por quotas numa SIIMO, não tendo os respetivos sócios deliberado que a transformação implicava a dissolução da sociedade inicial, não está sujeita a IMT.
Quanto à segunda questão, ou seja, se o prazo de 3 anos para a revenda dos imóveis detidos pela sociedade continuaria a decorrer na esfera da nova estrutura societária, a AT começou por invocar a al. b) do n.º 1 do art. 210.º do RGOIC que permite aos organismos de investimento coletivo a aquisição de imóveis para revenda.
Ora, uma vez que a nova estrutura societária prosseguirá o mesmo objeto social, o prazo de caducidade da isenção (3 anos a contar da aquisição dos imóveis), continuará a decorrer na esféria jurídica da SIIMO, enquanto e desde de que se mantenham inalterados os pressupostos dessa isenção.
NOTAS DA AUTORA:
A presente análise não dispensa uma leitura atenta e integral da Ficha Doutrinária ora analisada, bem como a legislação invocada, nem a consulta de um profissional para obtenção de esclarecimentos adicionais sobre cada caso concreto.
A Ficha Doutrinária pode ser consultada em:
http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/informacoes_vinculativas/patrimonio/cimt/Documents/IVE_14747.pdf