Por Claúdia Rodrigues Rocha – Advogada
“A Lei n.º 33/2019, de 22 de maio procede à trigésima alteração ao Código de Processo Penal (CPP), transpondo para a nossa ordem jurídica a Diretiva (UE) 2016/800, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2016, relativa a garantias processuais para os menores suspeitos ou arguidos em processo penal.
Com estas alterações, pretende-se que os menores sejam capazes de compreender e de acompanhar o processo, exercendo o seu direito a um processo equitativo, prevenindo-se reincidência dos menores e promovendo a sua integração social.
Quando os suspeitos ou arguidos em processo penal ou as pessoas contras as quais é instaurado um processo de execução de um mandado de detenção europeu sejam menores, os Estados-Membros deverão assegurar que o superior interesse da criança seja sempre considerado uma prioridade, de acordo com a Diretiva (UE) 2016/800.
Analisemos, seguidamente, de forma breve, em que consistem.
Desde logo, no que respeita à constituição de arguido, acrescentou-se o n.º 7 ao art. 58.º, cuja redação determina que a constituição de arguido menor é comunicada, de imediato, aos titulares das responsabilidades parentais, ao seu representante legal ou à pessoa que tiver a sua guarda de facto.
Ao rol de direitos e deveres dos arguidos, foi acrescentado o direito, em caso de menor, de ser acompanhado durante as diligências processuais a que compareça, pelos titulares das responsabilidades parentais, pelo representante legal ou pela pessoa que tiver a sua guarda de facto, nos termos da al. i) do n. º 1 do art. 61.º.
O menor pode-se fazer acompanhar por outra pessoa idónea por si indicada, quando circunstâncias especiais fundadas no seu interesse ou as necessidades do processo o imponham, e apenas enquanto essas circunstâncias persistirem, desde que aceite pela autoridade judiciária competente.
Cremos que poderão estar em causa, por exemplo, situações em que o fornecimento de informações aos titulares das responsabilidades parentais possa comprometer o processo penal, nomeadamente, quando possam ser destruídas ou alteradas provas, possam ser pressionadas testemunhas ou quando possam ter participado na alegada atividade criminosa juntamente com o menor.
Caso o menor não tenha indicado outra pessoa para o acompanhar, ou a pessoa por si nomeada foi recusada pela autoridade judiciária, esta proceda à nomeação, para esse efeito, de técnico especializado para o acompanhamento, nos termos do n.º 4 do art. 61.º.
Uma vez que o arguido tem o direito a ser informado, pela autoridade judiciária ou pelo órgão de polícia criminal perante os quais seja obrigado a comparecer, dos direitos que lhe assistem, essa informação deve ser também disponibilizada aos titulares das responsabilidades parentais, ao seu representante legal ou à pessoa que tiver a sua guarda de facto.
Para os efeitos supra apontados, a menoridade presumir-se-á se, depois de realizadas as diligências tendentes à sua identificação, a sua idade permanecer incerta e existirem motivos para crer que se trate de menor.
O considerando 13) da referida Diretiva, estabelece-se que os Estados-Membros deverão determinar a idade do menor com base nas declarações prestadas pelo mesmo, na verificação do registo civil do menor, na investigação documental e noutros elementos de prova.
Se esses elementos de prova não estiverem disponíveis ou não forem conclusivas, deverão fazê-lo com base num exame médico, contudo, este exame só deverá ser realizado em último recurso e em rigorosa conformidade com os direitos da criança, sua integridade física e dignidade humana.
Se, ainda assim, subsistirem dúvidas, então a pessoa considerar-se-á menor.
Em processos que envolvam arguidos menores, os atos processuais decorreram, em regra, com exclusão da publicidade, de acordo com a nova redação do n.º 3 do art. 87.º do CPP.
Na mesma linha de pensamento, a consulta de processos (que não se encontrem em segredo de justiça) e obtenção de certidão por outras pessoas não será admitida no que respeita aos autos de interrogatório ou outras diligências processuais nos quais participa arguido menor.
Em virtude da nova redação da al. b) do n.º 2 do art. 103.º, serão urgentes os atos relativos a processos em que intervenham arguidos menores, ainda que não haja arguidos presos, o que vem dar corpo às indicações da Diretiva (UE) 2016/800, que prevê que os processos penais em que intervenham menores sejam tratados com urgência e a devida diligência.
O despacho do juiz que determine as medidas de coação e de garantia patrimonial (à exceção do termo de identidade e residência), é igualmente comunicado, de imediato, aos titulares das responsabilidades parentais, ao seu representante legal ou à pessoa que tiver a sua guarda de facto.
O despacho de acusação do Ministério Público deve conter, sob pena de nulidade, a indicação do relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social, quando o arguido seja menor, salvo quando não se mostre ainda junto e seja prescindível em função do superior interesse do menor, nos termos da al. g) do n.º 3 do art. 283.º do CPP.
Por fim, para a elaboração da sentença, pode o tribunal considerar necessário à correta determinação da sanção que eventualmente possa vir a ser aplicada, solicitar a elaboração de relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social, ou a respetiva atualização quando aqueles já constarem do processo, sendo que, em caso de arguido menor, se ainda não se encontrar junto ao processo, deve a respetiva junção ocorrer no prazo de 30 dias, salvo se, fundamentadamente, se justificar a respetiva dispensa face às circunstâncias do caso e desde que seja compatível com o superior interesse do menor.
Estas novas alterações estão em vigor desde 23 de maio.”