«I – Estando em causa a prática do crime de tráfico de estupefacientes, a lei penal portuguesa é também aplicável a factos cometidos fora do território nacional, quando praticados a bordo de navio contra o qual Portugal tenha sido autorizado a tomar as medidas previstas no artigo 17º da Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e de Substâncias Psicotrópicas de 1988.
II – Se a embarcação onde se encontravam os produtos estupefacientes não tinha qualquer pavilhão/nacionalidade, não teria de ser solicitado qualquer tipo de autorização ao país da bandeira para a tomada de específicas medidas, mormente as referidas no artigo 17º, nº 4, da dita Convenção (ter acesso ao navio; inspecionar o navio; e, se se descobrirem provas de envolvimento no tráfico ilícito, adotar medidas adequadas em relação ao navio, às pessoas e à carga que se encontrem a bordo).
III – É, pois, possível o exercício da jurisdição penal portuguesa em relação a cidadãos estrangeiros no caso de embarcações sem nacionalidade, mesmo que intercetadas em alto mar, devido ao facto de o nº 2 do artigo 17º da Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e de Substâncias Psicotrópicas de 1988 as equiparar às embarcações que arvoram o pavilhão do Estado que faz a abordagem, visita e pratica os atos de autoridade a bordo.
IV – A jurisdição territorial portuguesa estende-se àquele tipo de embarcações, e, por isso, é de concluir pela competência internacional dos tribunais portugueses para tratar e julgar esse tipo de crimes e, bem assim, pela legalidade e legitimidade da atuação das autoridades portuguesas.»
Acórdão Integral do Tribunal da Relação de Évora de 10.09.2024