«“I – Tendo sido celebrado um acordo em que uma das partes declarou numa das cláusulas que renunciava a interpor qualquer processo judicial contra a outra, seja a que titulo for, obrigando-se, caso faça uso desse seu direito a interpor qualquer processo judicial, a indemnizá-la por determinada quantia, deve tal cláusula ser declarada nula, seja por constituir uma cláusula de objecto indeterminável, seja por configurar uma cláusula ilegal nos termos do art. 280º do CC.
II – Na verdade, esta renúncia geral a interpor acções judiciais contra a outra parte constitui uma obrigação indeterminável, uma vez que não se mostra delimitada nem restringida, seja quanto à sua fonte (por exemplo apenas aos direitos fundados na relação laboral), seja quanto à sua limitação temporal (decorre do clausulado que a obrigação é assumida sem limitação temporal).
III – Por outro lado, deve-se também entender que é ilegal (ilícita), porque a lei (e a Constituição da República Portuguesa – art. 20º da CRP) impede que as pessoas se possam vincular, sem qualquer restrição, a não recorrer aos tribunais para defender os seus direitos.
IV – Uma coisa é aceitar, como se admite no âmbito laboral, que as partes possam abdicar de determinados créditos ou direitos emergentes do vinculo laboral (remissão abdicativa – art. 863º do CC); outra coisa, bem diferente, é aceitar que as mesmas prescindam, de uma forma genérica, perante outrem, de defender os seus interesses em juízo “seja a que título for”, sem que tal renúncia esteja delimitada por uma determinada fonte das obrigações ou por determinado limite temporal”.»
Acórdão integral do Tribunal da Relação do Porto de 8.3.2021